segunda-feira, 3 de setembro de 2018

A Tartaruga




Quando menino eu era impaciente, arreliado e áspero no tratamento com as outras pessoas. 

Quando desejava alguma coisa, ao invés de solicitar com educação, azucrinava os ouvidos alheios até que, para se livrarem de mim, davam-me o que pretendia. Assim, transformara-me em uma criança moleta e pouco simpática. 

Eu percebia que aquilo aborrecia muito os meus pais, porém pouco me importava com isso. Desde que obtivesse o que queria, dava-me por satisfeito. Mas, está claro, se eu importunava e agredia as pessoas, estas passaram a tratar-me de igual maneira. 

Cresci um pouco e, de certa feita, me apercebi de que a situação era desconfortante e me preocupei, sem, entretanto, saber como me modificar. 

O aprendizado me foi dado em um domingo em que fui, com meus pais e meus irmãos, passar o dia no campo. Corremos e brincamos muito até que, para descansar um pouco, dirigi-me para a margem do riacho que coleava entre um pequeno bosque e os campos. Ali encontrei uma coisa que parecia uma pedra capaz de andar. Era uma tartaruga. Examinei-a com cuidado e, quando me aproximei mais, o estranho animal encolheu-se e fechou-se dentro de sua casca. Foi o que bastou. Imediatamente pretendi que ela devia sair para fora e, tomando um pedaço de galho, comecei a catucar os orifícios que havia na carapaça. Mas os meus esforços resultaram vãos e eu estava ficando, como sempre, impaciente e irritado. Foi quando meu pai se aproximou de mim. 

Olhou por um instante o que eu estava fazendo e, em seguida, pondo-se de cócoras junto a mim, disse calmamente: 

 - Meu filho, você está perdendo o seu tempo. Não vai conseguir nada, mesmo que fique um mês catucando a tartaruga. Não é assim que se faz. Venha comigo e traga o bichinho. 

Acompanhei-o e ele se deteve perto na fogueira que havia aceso com gravetos do bosque. E me disse:  

- Coloque a tartaruga aqui, não muito perto do fogo. Escolha um lugar morno e agradável.

Eu obedeci. Dentro de alguns minutos, sob a ação do leve calor, a tartaruga pôs a cabeça de fora e caminhou tranquilamente em direção a mim. Fiquei muito satisfeito e meu pai tornou a se dirigir a mim, observando:  

- Filho, as pessoas podem ser comparadas às tartarugas. Ao lidar com elas procure nunca empregar a força. O calor de um coração generoso pode, as vezes, levá-las a fazer exatamente o que queremos, sem que se aborreçam conosco e até, pelo contrário, com satisfação e espontaneidade. 

(E, para o resto da vida ... de Wallace L. Rodrigues, ed. O Clarim) 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário, ele é muito importante para a avaliação do nosso trabalho!